domingo, 22 de janeiro de 2012

CASTANHEIROS

Depois de se ter oferecido como catedral aos hinos dos pássaros, depois de ter dado sombra apetecida todo o Verão, o castanheiro doa-se nos fins de Outubro. Os ouriços rasgam um sorriso e espalham castanhas à passagem dos primeiros ventos. Em casa, já se aprontam pequenos maços de madeira.
Na aldeia, embrulhada ainda no manto do mosto dos lagares, rebuscava-se o último respigo das vinhas. E as castanhas caíam para ajudar a economia rural: durante dias seguidos, suculentas, permitiam poupar "pratos" mais dispendiosos. À noite, mal se chegava do "correio", depois do "terço", toda a família se reunia à lareira, em redor do panelo fumegante das castanhas.
Era também o tempo de fabricar o carro artesanal: uma vara grossa, com mais de metro e meio, encaixava, com pregos rudimentares, num eixo ladeado por dois queijos de madeira; antes da outra extremidade, um pau pequeno, em cruz, servia de guiador. Alguns pregos, à moda de cabide, seguravam a carga eventual: um regador de água, um caldeiro de nabal, uma cesta de castanhas...E dava gosto ir bem cedo, antes da aula, com o carro, apanhar as castanhas.
Era ainda sob o olhar terno e maternal dos castanheiros que comíamos as merendas preparadas por nossas mães para o dia dos magustos: pão com marmelada, doce de abóbora, além das castanhas que sabíamos assar com mestria.
Nos dias de tormenta - chuva e frio - o tronco esburacado do castanheiro velhinho servia-nos ainda de abrigo como o regaço materno. Também havia as "vacas", de aspecto avermelhado, que nasciam no tronco e que eram deliciosas para o paladar aldeão.
Por tudo isto, não é com indiferença que se olha esta folhagem esverdeada amarelecendo no outono rural.

- Mário Lourenço

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