Na Beselga, pelos finais dos anos
cinquenta, antes da hora da carreira, no adro de baixo, sentados na cerca do
chão da Igreja, assistíamos, crianças, a um rodopiar de gentes: vinham de um
fim de dia de trabalho na barragem, outros tinham terminado o dia na
agricultura mais cedo – era o arraial de Santa Eufêmia. Do vale, do adro de
Cima iam aparecendo vultos estranhos de gente que passava com animais e cargas
de mercadoria para ir vender a Penedono. Outros iam fazer compras, divertir-se,
comer a marrã. Muitos iam cumprir promessas junto da milagrosa Santa. Vinham da
Sarzeda, Sernancelhe… Como nas romarias ancestrais, fundia-se o religioso com o
paganismo. Também a Maria da Cruz já tinha partido com os seus refrescos.
À noite, os mais velhos iam ao
arraial ver as bandas de música a tocar ao desafio, rusgas de gentes, que
vinham de longe desde as margens do Douro, que cantavam e dançavam em grupos
até de madrugada.
Santa Eufêmia era também um festival
de correrias de rebanhos, bem pintados, que tinham de fazer a romaria em volta
da capela seguindo o seu pastor que, quando fechava o círculo com as suas
cabeças de gado, saía da fila indiana e deixava as ovelhas em correria
desatinada a cumprir a sua romagem que lhes afastaria as doenças e daria
fertilidade…Ainda não havia carrinhos e carrocéis, como agora, no largo mal iluminado. Mas havia tendas de brinquedos, doceiras com bolos em forma de medalhas e pirolitos e laranjadas da Beselga… Também havia muitos frutos da região - figos da Póvoa, melões, uvas…
Os agricultores compravam as rasas de erva para semear, os martelos de madeira para britar os ouriços que, em breve, arreganhariam, alegrando a frágil economia doméstica.
Depois da missa e procissão do dia dezasseis, dos foguetes e do cumprimento das promessas era a debandada, o regresso à vila ou às terras de origem. Fechava-se um ciclo de festividades que alegrara todo o verão as várias localidades. Vinha aí o Outono com a escola, o frio, a chuva, a neve a obrigarem a uma atividade mais comedida.
-Mário Lourenço
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