quarta-feira, 24 de março de 2010

RETRATOS CEIREIROS: O TONINHO DO ANTERO

O Sr. António Teixeira morou junto do adro, na casa do sr. Antero, que era barbeiro. Desde esses tempos que os seus ditos caíam em graça aos clientes.
Porém, para a nossa memória infantil, começou a inscrever-se como protagonista relevante da epopeia ceireira , a partir do momento em que conquistou a aldeia com os seus carnavais: na companhia do Zé Gaitas, da srª Dalinda da Ana, da srª Olímpia, eles corriam as ruas de volta ao povo, corroendo e sintetizando os anais dos usos e costumes beselguenses.
Acompanhávamo-los de volta ao povo, nas tabernas e, sobretudo, no Adro de Baixo onde observávamos os trajes ridículos e as histórias mordazes de comicidade popular que eles teciam num enredo improvisado.
No entanto, a grande coroação, como herói cómico, adveio-lhe do primeiro teatro, muito bem produzido por um grupo de pessoas, que se realizou na garagem do sr. João do Amêndio, nos finais da década de 50 ou princípios de 60. O grande dinamizador foi o sr. Padre Donaciano, que acabava de chegar à paróquia em substituição do velho Pe Carlos.
As pessoas da aldeia foram, pelos seus papéis de actores, erigidas a um estatuto de heróis admirados por toda a povoação. Recordo-me da “moleirinha”, de um “preto” muito bem caracterizado (creio que o Zé Saraiva, hoje na Austrália) e, acima de todos, o sr António do Antero que aí dramatizou as várias peripécias vividas numa viagem a Lisboa de um modo tão cómico (o bilhete picado, as verças espremidas no Entroncamento, ou a entrega das chouriças em Lisboa, as casas que andavam… ), que nunca mais consegui olhar para ele sem esboçar um sorriso.
Nesta época de Quaresma, aparentava algum cansaço, alquebrado pelo duro trabalho que o curvava depois de uma vida irrequieta. E quis retirar-se de cena, deixando o palco da vida ceireira mais pobre e mais triste por estes lados do Oitão.

- Mário Lourenço

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